domingo, 7 de maio de 2023


— O QUÊ?! 


Minha voz ecoou pela estação, atraindo olhares curiosos. Meu sorriso pela manhã simplesmente desapareceu, coagulando como leite azedo. Era como se todos os planos cuidadosamente traçados desmoronassem diante dos meus olhos.


CAPÍTULO VII
PÉS NA ÁREA SELVAGEM


Eu havia acordado às cinco da manhã, desafiando o cansaço que ainda pesava em meu corpo, para me preparar muito bem. Eu tinha tudo sob controle e estava determinada a chegar a tempo da abertura do evento em Motostoke. Mas agora, diante da gigantesca tela da estação que anunciava o cancelamento do meu trem de última hora, toda a minha ansiedade e frustração explodiram dentro de mim.


Recusei o convite de boa fé de Sonia para me levar até lá, confiante de que chegaria a tempo. Os sentimentos de raiva e decepção me dominaram enquanto olhava para a multidão ao meu redor.


 As pessoas pareciam tão tranquilas e indiferentes, enquanto eu estava lutando para não entrar em pânico.


Minha mochila pesada nas costas parecia mais um fardo do que um item essencial. Não sabia o que fazer, me sentindo como uma barata tonta em uma cozinha desordenada. O peso da decepção e do estresse aumentava a cada segundo, enquanto eu tentava desesperadamente encontrar uma solução para seguir em frente.


Caminhei sem rumo pela estação, tentando encontrar alguma solução. Até que avistei um aglomerado de pessoas perto do balcão de informações. Decidi me juntar a eles, na esperança de descobrir alguma notícia positiva, fui praticamente uma das últimas a ser atendida.


A funcionária atrás do balcão mantinha uma expressão séria na sua face, estudou-me de cima a baixo por debaixo daqueles seus óculos redondos e deixou escapar um suspiro impaciente dos seus lábios. 


— Bom dia, querida. Como posso ajudar? – diz ela teclando no computador, apenas movendo os olhos para me fitar por um curto tempo. 


Meus dentes se fecharam em uma careta involuntária enquanto eu lutava para manter a compostura.


— Hmm... A minha passagem foi cancelada e eu gostaria de saber o porquê. – balbuciei. 


A mulher parou momentaneamente de teclar, pensei que fosse me responder, mas apenas deu um gole no seu copo de café e logo deu uma mordida na sua torrada  com manteiga. O cheiro de café amargo e pão tostado invadiu minhas narinas, mas não consegui apreciar. Pela primeira vez tive raiva do cheiro. 


Ela então voltou a teclar e só depois decidiu me responder:


— Problemas no arranque. – sua resposta foi curta e pouco esclarecedora.


Minha frustração cresceu ainda mais. Aquela resposta vaga não era suficiente para justificar o transtorno que eu estava passando. Eu tentava manter a calma, mas a raiva borbulhava dentro de mim.


— Repentina falta de energia, talvez.

— E... tem alguma maneira de ser compensada? – perguntei com um pouco de esperança.  Ela parou mais uma vez de teclar e levantou os seus olhos para me encarar, estática – Eu não tenho culpa da falta de energia.


— Muito menos eu, querida. – ela resmungou. Meu sangue ferveu.  

— O que eu quero dizer é se tem alguma maneira de eu ser reembolsada. – falei, mais uma vez tentando ser paciente.


Ela voltou a teclar, pediu meu nome e me fez mostrar o código QR do meu bilhete pelo celular. Muito lentamente ela foi digitando as letras e os números no sistema, me deixando aflita.  


— Azar, querida. - falou. - Não sei se viu, mas você comprou um bilhete que não inclui reembolso.


Se ela falar querida mais uma vez eu juro que vou explodir:

— Você pode pedir por uma nova passagem, mas lhe custará um extra de vinte Libras. A viagem seria daqui três horas.   


Minha decepção era palpável. Eu nunca mais compraria um bilhete deles novamente. Eu balancei a cabeça, recusando a oferta de comprar um novo bilhete. O capitalismo era uma maldição.


— Bem, espero que tenha sido útil e respondido todas as suas perguntas. – ela disse com um sorriso falso. – Obrigada por viajar conosco. Próximo!


Eu não tive tempo de responder antes que ela atendesse o próximo cliente. Eu respirei fundo e saí da estação, sentindo o peso da frustração e do estresse em meus ombros. Só me restou então ir pelo parque da Área Selvagem, talvez por lá encontrasse alguém que me desse carona e me levasse até a cidade.


Antes de seguir para o posto de controle, fiz uma parada rápida para comprar alguns mantimentos e uma bússola, torcendo para que fossem suficientes para me sustentar durante a minha estadia em Motostoke. 


Com a mochila pesada nas costas, continuei a minha jornada até os confins da cidade, onde avistei um grande pedágio. Eu segui pela estrada mais estreita, enquanto os carros passavam pelo caminho maior, em uma fila que se movia muito mais rápido do que a minha. Eu podia ver oficiais da polícia inspecionando os carros e, trabalhando em equipe para evitar a entrada de drogas ou outras substâncias ilegais de uma cidade para outra.



No meu caminho existiam duas filas divididas imensas, cheias de alpinistas com suas mochilas enormes e óculos de proteção, turistas com suas câmeras e mapas, e treinadores com seus equipamentos esportivos.


Finalmente, quando chegou a minha vez, olhei para o meu celular e percebi que já eram quase oito da manhã. Dois policiais protegiam a entrada para o parque, um deles sentado atrás de uma mesa de vidro reforçado.


Deslizei o meu ID Pessoal e de Treinadora pela venda e o policial o examinou cuidadosamente antes de devolvê-los, juntamente com um formulário e uma caneta.


— Leia tudo com calma e assine, por favor, Jovem — disse ele.


Passei os olhos pelo formulário, conferindo as diversas regras e regulamentos do parque com orientações para visitantes, como não danificar a flora e fauna locais, respeitar o cuidado com o lixo e a proteção contra incêndios florestais, além das regras de segurança e das restrições específicas de acesso a determinadas áreas do parque.


Era importante seguir aquelas regras a fio, ainda me lembro da história que vi nas notícias anos atrás, e que faz o arrepio subir pela minha espinha. 


Um grupo de jovens, que desrespeitou as restrições de acesso em uma área de preservação, pensando ser apenas uma brincadeira. Mas, ao entrar na caverna, eles se depararam com um perigoso e furioso Onix. Tentaram fugir, mas o preço foi alto demais. Um deles foi abandonado, e infelizmente veio a falecer.


Durante meses, o tópico foi discutido, com debates sobre como adolescentes deveriam ter acesso somente com a companhia de um adulto, ou como havia uma negligência por parte dos policiais responsáveis pela segurança do parque. Muitos questionaram por que o parque não era mais monitorado, e por que as regras e regulamentos não eram mais rigorosamente aplicados. 


Mas, no final, nada mudou. 


O parque permaneceu o mesmo, um lugar de beleza e perigo, onde a natureza reina suprema e os visitantes devem estar sempre alertas e respeitar as regras, ou arriscar as consequências.


Eu jamais me meteria num problema nesse nível, nem em um grupo de amigos estaria, quanto mais em uma zona proibida. 


O policial me observava atentamente enquanto eu fornecia informações como meu nome, endereço e número de telefone, juntamente com outros detalhes relevantes em caso de desaparecimento. Li também sobre os termos de responsabilização e, em silêncio, assinei o papel, ciente de que a minha segurança e bem-estar estavam em jogo.


— Corajosa, hein... – disse ele, rindo. – Seja bem-vinda a Wild Area, jovem. Espero que se divirta e não se esqueça de se aventurar com responsabilidade. 


Passei pela barra e estava agora com os pés na Área Selvagem.


Apesar das histórias e algumas noticiais macabras, a Área Selvagem era o parque nacional mais popular do país para caminhadas e turismo ao ar livre. A beleza natural da paisagem montanhosa, dos lagos cristalinos e das aldeias pitorescas atraía visitantes de todos os lugares.


O parque era tão vasto que se estendia até Motostoke e continuava além, em direção ao norte. Incluía uma das cordilheiras mais altas do país, a oeste, bem como os dois famosos lagos, Axewell e Miloch. A região também era conhecida por sua rica história e cultura, com muitos locais históricos, como castelos antigos e abandonados e abadias.



Era um lugar popular para atividades ao ar livre, incluindo caminhadas, escaladas, ciclismo e canoagem. Até mesmo a implacável Bea era vista algumas vezes treinando nas montanhas e nos desertos a norte. 


Liguei o meu celular, mas já sabia que a conexão logo seria perdida, então baixei o mapa para o modo offline. Eu estava em uma jornada incerta, seguindo um caminho de terra batida que, supostamente, me levaria para Motostoke. Não havia ninguém para me guiar ou oferecer ajuda, eu estava sozinha em meio à vastidão da natureza.


A paisagem era deslumbrante, porém selvagem e inóspita. As montanhas se elevavam majestosas ao meu redor lá de longe, enquanto eu sentia a brisa fria no rosto, ao mesmo tempo em que me preocupava com o tempo que levaria para chegar ao meu destino.


Calculando minha caminhada, percebi que levaria cerca de 64 horas para chegar a Motostoke, contando cinco quilômetros por hora sem parar. A essa altura, sabia que levaria mais de uma semana para completar a jornada a pé. Eu precisava de ajuda, um carro para me transportar, mas a estrada era simples e restrita, feita para preservar a natureza.


Fiquei esperando na beira da estrada, mas nenhuma alma caridosa parou para me ajudar. Eu sabia que estava sozinha e teria que continuar caminhando, apesar da incerteza e do medo de que tomavam conta de mim.


Decidi caminhar então rumo a região de Dappled Grove mesmo sabendo que seria uma longa caminhada. Coloquei meu celular no bolso e certifiquei-me de ter o mapa offline em mãos, para caso eu precisasse.


Cheguei em um momento que a trilha estreita era cercada por árvores altas, que formavam um teto verde acima da minha cabeça. O canto dos pássaros e o zumbido dos insetos preenchiam o ar com uma sinfonia natural.


Não pude deixar de sorrir ao soltar Axel, meu coelho, para que ele pudesse se divertir e explorar a natureza. Ele parecia animado em saltar e correr pela trilha, e eu fiquei feliz em vê-lo tão feliz.


As paradas que fiz ao longo do caminho eram necessárias para apreciar as paisagens deslumbrantes e descansar um pouco. Sentia meu coração batendo forte, mas a sensação de liberdade e aventura que me invadiu era indescritível.


Cheguei a Rolling Fields por volta do meio-dia, depois de caminhar horas sobre a paisagem irregular do parque. Ao avistar aquelas colunas hexagonais, sabia que finalmente havia chegado a um dos pontos mais impressionantes do lugar. Mas a beleza natural daquele lugar também me deixou tensa, já que andar sobre as colunas de basalto parecia perigoso demais. No entanto, meu Scorbunny, Axel parecia bem mais à vontade, pulando de uma rocha a outra com muita agilidade e sem preocupações.



Aqueles pilares de basalto eram todos uniformes em tamanho e altura, se encaixando perfeitamente uns nos outros, como se tivessem sido cuidadosamente colocados no lugar. Mas havia alguns espaços entre eles que me faziam temer uma queda. Afinal, aquela maravilha da natureza ficava próxima à borda do gigantesco Lago Axewell. Em meio às rochas, pequenos arbustos e gramíneas cresciam, criando um contraste interessante com a paisagem rochosa.


Enquanto estávamos ali, conseguimos ver alguns grupos de Kingler andando e Pelipper voando em direção aos seus ninhos nas encostas rochosas. E mesmo com outras pessoas mais distantes, que tiravam fotografias e caminhavam tranquilamente, a sensação era de que éramos os únicos no mundo, com apenas o som do vento e dos Pokémon que habitavam a região.


Mas logo a realidade se impôs: Axel havia se cansado, e quando tentou chamar minha atenção com um salto, acabou errando a distância e caindo levemente no chão. Hora seguir em frente.


— Acho que você precisa de mais um pouco de treino para esses pulos, Axel. — falei enquanto acariciava a cabeça do meu companheiro de viagem. Ele olhou para mim com seus olhos escuros e brilhantes como se estivesse concordando comigo.


Um trovão estrondoso ressoou por Rolling Fields, ecoando pelas montanhas e fazendo o meu coração saltar no peito. As aves que voavam nas proximidades se agitaram, voando em círculos no céu em busca de segurança. 


Eu me perguntei se algo estava errado com o clima.  O céu estava incrivelmente limpo e agradavelmente azul, sem nuvens ameaçadoras à vista, olhei para o meu celular e confirmei que não havia previsão de chuva ou trovão, mas isso não acalmou minha ansiedade. Algo me dizia que eu deveria ser cautelosa.


Eu apertei o passo, segurando firmemente a alça da mochila enquanto me esforçava para encontrar um local seguro para me abrigar, Axel, estava logo atrás de mim, olhando para mim com seus olhos inquisitivos. Eu não podia deixar que ele soubesse que eu estava com medo, então tentei manter a calma.


O terreno acidentado da região tornava a caminhada difícil e cansativa, mas eu estava determinada a encontrar um local protegido antes que a tempestade chegasse. Afinal, não havia nada pior do que ser pego desprevenido no meio da natureza.


Mas a verdade era que eu estava com raiva e frustrada. O trem que eu tinha planejado pegar havia sido cancelado, e a funcionária da estação havia sido incrivelmente rude comigo. Eu sabia que havia sido orgulhosa demais para pedir ajuda e voltar para o laboratório, mas agora era tarde demais para voltar atrás.


De longe consegui avistar um ponto seguro onde poderia parar e montar o acampamento, os trovões voltaram a retumbar pelo ar enquanto eu andava fazendo até mesmo Axel ter passos hesitantes e estar próximo de mim, buscando segurança.


É... seria melhor ficar lá até essa maldita tempestade estranha passar...


{ 2 Comentários... leia-os abaixo ou comente }

  1. Assim Gloria chega à Wild Area. Boa sorte a sobreviver Gloria. Mas se sobreviveu à mulher carrancuda, nada mais te vai impedir de viver nessa área selvagem!

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    1. Mais Worldbuilding!!!

      Desculpa Shii, eu prometo prometo que o próximo capítulo vai ter algum movimento. Quero mostrar as pessoas o quanto a Wild Area pode ser divertida ao mesmo tempo perigosa. É uma gigantesco parque nacional afinal, várias coisas podem acontecer kkkk.

      Obrigado pelo comentário, princesa ❤️, vamos ver como ela vai se safar?

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